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quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

TVE-RS - A agonia do desamparo

Por Valério Cruz Brittos e Diego Costa
Fonte: Observatório da Imprensa
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?msg=ok&cod=574IPB001&#c
26/1/2010


A TVE-RS, pertencente à Fundação Cultural Piratini, vem prestando importantes serviços à comunidade gaúcha desde sua fundação, em 1974, em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. No entanto, tem potencial para fazer muito mais, radicalizando sua missão de serviço público, para tal necessitando desatrelar-se dos governos de plantão, uma característica de sua atuação. De toda forma, possui uma programação voltada para os meios culturais e notícias da região e cumpre papel social ativo no setor televisivo.

Nos últimos anos, vem aumentando seu grau de dificuldades de operação na mesma proporção em que tem sido intensificada a desatenção do governo estadual para com os objetivos da televisão pública, em especial a respeito do Conselho Deliberativo e dotação orçamentária adequada para produzir e distribuir conteúdos que atendam à diversidade social. No ideário neoliberal, um canal público de TV é descartável, na medida que (quase) tudo, inclusive a midiatização, deve ser entregue ao privado.

Não se identifica um compromisso do governo do estado do Rio Grande do Sul em relação à TVE. Os embates entre as diretorias da emissora, nomeadas pelo Executivo, e o Conselho Deliberativo têm sido freqüentes nos últimos anos, assim como as denúncias de interferências em sua linha editorial. Agora, a TV Educativa do Rio Grande do Sul vai mudar de prédio, pois estava instalada em um imóvel pertencente ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) — e um acordo não foi viabilizado por aparente falta de empenho para tanto.

A necessária independência

Um possível convênio com a TV Brasil não foi definido, ao que tudo indica, por questões menores, já que aquela é controlada pelo governo federal, comandado pelo PT, e a TVE é da alçada de um governo estadual do PSDB. A emissora gaúcha preferiu seguir retransmitindo a programação da TV Cultura, de São Paulo, mediante um pagamento mensal, enquanto a TV Brasil cederia seus conteúdos gratuitamente. Mais do que isso, o problema é que as questões partidárias ou de governos seguem sobrepondo-se às públicas.

Na verdade, a prioridade de atender aos governos não é exclusividade da TVE do Rio Grande do Sul. Não necessariamente no mesmo grau, interferências político-partidárias identificam-se até em algumas estações públicas européias, ainda que na Europa encontrem-se exemplos históricos de compromisso social, como a BBC. Em qualquer dos casos, trata-se de uma espoliação da sociedade, que perde um dispositivo efetivamente público num embate que, principalmente no Brasil, contabiliza muitas derrotas.

Carece a TVE-RS de um modelo de financiamento adequado que garanta a quantidade de recursos suficiente para cumprir seu compromisso público e, em simultâneo, assegure sua autonomia em relação aos governantes de plantão. Necessitando sempre do governo estadual para administrar suas decisões financeiras, apresenta-se hoje como uma emissora que, apesar do esforço de seu quadro de funcionários de carreira, tem dificuldade de se manter com a independência necessária para midiatizar a realidade aos gaúchos.

Transparência e seriedade

Cedo ou tarde terão que ser discutidas as relações de poder entre Estado e setor privado, cuja dinâmica, considerando-se elementos como parceria publicitária e acessos prioritários a fontes, tem garantido o espaço da televisão comercial, mas não o avanço da comunicação pública, seja detida pelo Estado ou não. Isto se chama ausência de compromisso para com a coisa pública, numa área tão estruturante quanto a comunicação, cuja força econômico-político-social é mais que sabida, como reconhecem o mercado publicitário e o setor político.

A sociedade precisa acompanhar de perto este momento crucial envolvendo a TVE do Rio Grande do Sul, monitorando a anunciada mudança para um prédio emblematicamente denominado Centro Administrativo. Como se espera que as administrações estaduais se mantenham distantes dos ambientes públicos de comunicação — e o Estado cumpra sua obrigação de fornecer referentes comunicacionais aos cidadãos —, é hora de os eleitores ficarem vigilantes, cobrando transparência e seriedade nesse campo.

Um comentário:

Alexandre Leboutte da Fonseca disse...

Muito oportuno este artigo. A Fundação Piratini (gestora da TVE/RS e da FM Cultura) está à beira da paralisia. A prioridade de produção é para programas de estúdio que não necessitem de equipes de externa, isto é, um entrevistador e um ou dois entrevistados (aquilo que chamam de rádio na TV). Já a rádio, funciona na maior parte do tempo gravada no computador.
Pela primeira vez a TVE não fez a cobertura especial do Fórum Social Mundial, apenas uma ou outra matéria. Em outros tempos, transmitíamos os shows, palestras, debates, conferências.
O problema não é só no FSM. Sem qualquer explicação convincente, o caminhão não foi liberado para gravar o show de Nei Lisboa para o programa Palcos da Vida (nem no dia 18 nem no dia 25 de janeiro), embora já estivesse agendado entre a produção da TVE e do artista gaúcho.
Vivemos um momento muito triste, a um passo da extinção definitiva de seu caráter público. O mesmo governo que decidiu ignorar completamente a existência do Conselho Deliberativo da Fundação Piratini, negando-se a entregar qualquer documento ou informação ao colegiado, em uma afronta à lei estadual 10.535/95, agora decide retirar as emissoras da melhor localização de Porto Alegre, no prédio onde iniciou a TV no RS (em 1959, com a TV Piratini), no topo do Morro Santa Tereza (com vista geral da cidade), para instalá-las no núcleo físico da administração do governo do RS, o Centro Administrativo. Que golpe! Que violência! Nossa governadora destila fel contra a TVE. Jamais pisou aqui depois de eleita. Isso não a impede de usar a TVE para propaganda de governo. Grava seus programas no Palácio Piratini e manda colocar na grade. Absurdo! A intervenção se completa com alguns CCs que ocupam postos com poder de decisão, especialmente no jornalismo, talvez o segmento da programação mais afetado nestes três longos anos.
Nós, funcionários das emissoras, faremos o possível para resistir neste últimos meses de desgoverno e evitar a implosão da TVE e da FM Cultura.
E que a governadora pague o merecido preço pelo que está fazendo, bem como aqueles que aceitam fazer o serviço sujo.
Alexandre Leboutte da Fonseca
Jornalista -TVE/RS - Membro do Conselho Deliberativo